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segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Velas






são setas as velas

são verdes as vagas

é vago o destino


palavras divagam

dispersa-se a vida

e perdem-se amores
nos versos do vento

pelas veredas do barro

no enigma do verde


pequenos barcos revelam

as rotas de não vagar


são setas as velas

são verdes as vagas


é vago o destino


qual o sentido de amar?



                        Lilia

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Tentação

Tentaçao






Graciosa cerâmica!



Sensível à tua beleza,



Sinto-me tentado,



Pela admiração,



A pousar em ti



Um afago de mão.

                                  Sergio Mudado
                              

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Janela sobre o erro

         Janela sobre o erro    


    Ocorreu no tempo das noites longas e dos ventos de gelo:certa manhã floresceu o jasmim do Cabo, e no jardim da minha casa, o ar frio impregnou-se de seu aroma, e nesse dia também a ameixeira floresceu e as tartarugas despertaram.
  Foi engano e durou pouco.Mas, graças a este erro, o jasmim, a ameixeira e as tartarugas puderam acreditar que alguma vez o inverno terminará. Eu também.
           
                               Eduardo Galeano



  

Janela Sobre a memória

       
      Janela sobre a memória

  À beira-mar de outro mar, outro oleiro se aposenta em seus anos finais.
  Seus olhos se cobrem de névoa, suas mãos tremem:chegou a hora do adeus.
  Então acontece a cerimônia de iniciação: o oleiro velho oferece ao oleiro jovem a sua melhor peça. Assim manda a tradição,entre os índios do noroeste da América: o artista que se despede entrega sua obra prima ao artista que se apresenta.
   E o oleiro jovem não guarda essa peça perfeita para contemplá-la e admirá-la: a espatifa contra o solo, a quebra em mil pedacinhos ,recolhe os pedacinhos e os incorpora à sua própria argila.

                     Eduardo Galeano [ As palavras andantes]

domingo, 22 de agosto de 2010

Embarcação

qual o sentido do mar?






são setas as velas

são verdes as vagas
é vago o destino



palavras divagam
dispersa-se a vida
e perdem-se amores



nos versos do vento

pelas veredas do barro

no enigma do verde


pequenos barcos revelam

as rotas de não vagar



são setas as velas

são verdes as vagas

é vago o destino




qual o sentido de amar?


             Lilia

sábado, 21 de agosto de 2010

Muro


Engenharia



É como se fosse escrita,

hieróglifos,

quem sabe, tijolos?

Mas, com certeza construção,

como a arte,

como a própria vida.

                                   Ivan Wrigg
Algo Mulher




Teu dorso

guarda a beleza

de uma invenção perfeita

e retrata

um pouco de deusa

e um pouco de gata.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Painel Pássaros



                Zonza,


               projeto as asas

               na porta da tua casa

                                                  Teresa Melo

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Útero



Útero




O céu e sua noite;

fábrica de estrelas.

                             Ivan Wrigg

Fantaisie


Guardar teus segredos.




Teus traços

misturados aos meus.



Falar sério

dos nossos brinquedos.


                                    Ivan Wrigg

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Seringueira

Seringueira






Cortar na carne

a liberdade
de espalhar poesia.

     
                       Ivan Wrigg


            

                   

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Painel

Rebatimento


Tudo tenho


Tudo falta

Minha metade de dentro

completa

a minha metade de fora.

                                      Ivan Wrigg

Porta cartas

Ninho 


Voou o tempo


                                            Como voou teu recado

                                            Como voou teu toque

                                            Mas fica o pouso

                                           pra te receber,

                                           sempre.


                                                               Ivan Wrigg

domingo, 6 de junho de 2010

Nervuras


Nervuras


São como veios, veias,

Cruzando, rasgando, a pedra

Que se retorce, regular e bela

Que se curva à própria beleza,

Nervosa, fria, fragmento

Estático, momento capturado,

Presente.


                     Um Barco

Simetria















 Simetria


Num céu enevoado,

Finito e curvo,

As linhas

Aliciam olhares

Alistam vontades

Alumiam sonhos

Alinham-se obedientes,

Aninham-se as linhas,

Confortadas, comportadas,

Compenetradas, mansas

Na regularidade simétrica

Dos sorrisos calmos.


                            Um Barco

Forma


Forma


Regular, que seja,

Simétrica que se deseje,

Imperfeita, pois de humana origem,

Fênix de pedra, do forno parida,

Forma e sonho,

Desejo vago,

Abstração e realidade,

Juntas.

                       
                           Um Barco

domingo, 25 de abril de 2010

ENTRE AS LINHAS




Emaranhados que se perdem no vazio! Vazio?

Desafios de linhas que acumulam murmúrios.

Como nós a se desfazer! Sobe e desce devagar.

Enrola e desenrola novelos da lã cor terra.



Cores e luzes, esfera linear! Aquarelas e esperas.

Era de se esperar ver a luz do dia! Arte na arte.

Brilho transparente como uma teia ardente.

Tece, tece, tece, desembarace essa parte.



Presença de fios leves quase arredondados.

Amarre-os! Desate-os! Solte-os pelo ar! Pelo ar.

Como um eco similar as linhas soltas do quadrado.

Siga o som, siga o tom, deixe-os viver o destino.



Faça retas circulares em alto relevo sem ética.

Use e abuse de cores degradês, abuse dos traços.

Crie laços perpendiculares a sua vontade eclética.

Novamente desate os nós que estão dentro de você.



Soraia

Voo

TOQUES DE MÃOS






Escadas que nos levam a algum lugar.

Céu azul, cores fortes! Caminhos revistos.

Beleza negra de passos sem rumos certos.

Invado esse espaço e entro em uma curva.



Curvas curvilíneas e arredondadas.

Nuvens rasas, dores que ficam para trás.

Simetria ao delinear a cerâmica branca.

Quase um toque! Toques vivos e naturais.



Toques aveludados que compõem músicas.

A música feita pelos toques das mãos lisas.

Lisas são as paredes de uma arte! Nuas e cruas.

Detalhes em negritos mistura-se um branco.



Branco que chegam ao céu! Céu de licor anis.

Eu até quis dizer sobre a arte de fazer grés.

Observo o fuso horário no contraste da cor.

Enfeites laterais! Peças casuais alinhadas aqui.





soraia

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Vasos porcelana desenhos geométricos

Preto e branco, branco e preto


As formas geométricas marcam o caminho.

Escada para o infinito.


bel

Bowl branco

Linhas suaves,


de fora te enxergo por dentro.

Beleza pura
               
                                                Bel

quarta-feira, 3 de março de 2010

Vias

Vias






Ao chegar em casa, Marina pôde sentir o cheiro de cigarro que vinha da cozinha. Aquilo a incomodava profundamente. Odiava este vício da mãe.

Fechou a porta e jogou a bolsa sobre a mesa, passando direto para o quarto. A cama ainda estava desfeita, e roupas e sandálias caídas no chão eram mordidas por Bruce, o filhote de poodle que Joana, a vizinha, lhe deu de presente.

- Mas que droga! A menina vociferou e o cachorrinho, assustado, enfiou-se embaixo da cama. Amarrando os cabelos, Marina foi juntando tudo com os pés e abaixou-se para pegar as roupas.

A mãe fumava enquanto olhava pela janela protegida por uma tela. Os anéis de fumaça eram cortados pelos fios de nylon que ocupavam aquele espaço de onde se poderia ver a chuva fina que ao tocar o solo fazia levantar uma fina camada de poeira.

A sobreposição dos fios era precisa e, se mudada a perspectiva de quem a olhava, podia parecer um detalhe de chochê e até uma macarronada sem molho.

O barulho da máquina de lavar assustou Beatriz, até então absorta. A filha jogava as roupas com uma raiva que atraiu o olhar curioso da mãe. Mas a garota permaneceu indiferente.

E ali, na cozinha, cada uma delas lidava com suas frustrações da maneira que lhes parecia mais fácil. Fosse chutando e jogando coisas, ou lançando fumaça pelos ares.

                 Vera V

Borboleta



     Borboleta

 
    dispostos com forme pares apostos


lepidipidóptera axiálica completética ergonomímica quadriláptera

sólida assente aspiração dita volátil seja

qual volta diretívica retilímbica retabulárica antiperdulárica

decapralá se se volta sempre regrada bem disposta

nos eixos nus polos nos flapes

                              Lilita

Porta lápis

Porta Lápis




risssca traça passa prime cozinha ordenha alinha


que cruza

quencolhe

quiquebra

ponta seca lápis preto fundo branco barro rosa

apolpa eterna comprida terna cumprida ameaça

                                  
                                                         Lilita

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Dispersão


Dispersão






No dicionário, ato ou efeito de dispersar!

Mas para os olhos sobre a peça ficam inválidas estas definições.

Então!...

Dispersão: Aproximação,

junção,

beleza que aprisiona olhares.



Maria Izabel

                  Trio




Do toque artesão nasce a trilogia ou trindade - espaços criados à mão.

Força e beleza!



Maria Izabel

Rodopio


          Não sei
Se foi o vento, ou uma brisa...

que te girou e assim criou.

Ou simples gestos de menina

abrindo espaços pra muita flor...



            Maria Izabel

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Uccello Dell`Alba

L’Addio all’Uccello dell’Alba




Além da luz

oblíquo vulto traça

o arco inesperado

a trajetória inconsútil

sutil

mente



Jogo de espelhos

ato de magia

a dama vermelha recorrente desafia

a entropia



Mais rápida que os olhos

a forma cresce

desvanece

s

na curva do horizonte



Arrasta

força irresistível

cada partícula de aurora

cada fragmento

vento

evento



Na recessão das galáxias

todo limite asfixia

o passo

no espaço



Pássaro,

passará


                        Sergio Castro Neves

Porta cartões

Diluição




Aquele amor uma aquarela. Delicadas transparências em perfeita justaposição. Tela fluída em manchas tonalizadas. Suaves espaços em branco. Silêncio. Para aquela aquarela luz e sombra. Momentos de “quinta justa”. Mas fluiu tanto, que ultrapassou a moldura, tingiu paredes, chão, terra e se evadiu de mim. Para esta saudade um teatro mambembe onde crio velhas personagens e sinto antiga emoção.



maria izabel

Toques

Toque




Sempre me encantou a palavra. Alguém percebeu, brincou: - Você morre pela boca! Morro.

E morria mesmo. Mas, por palavras perfeitas, completas, onde a boca se movimenta inteira, com lábios, língua e dentes. Foi essa totalidade que me envolveu, frases e toques. Palavras, que afinal ficaram, vazias, esgotadas, esquecidas. Mas a sensação do toque, ah, esse ficou e ainda me arrepia.



                                                      maria izabel







   
               

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Construção

CONSTRUÇÃO




Uma página completa de barras decorativas!

Ficava horas desenhando as simétricas. Gostava! Não havia dificuldade alguma. Um quadro se repetindo após outro, sempre igual. Era só manter a proporção entre eles.



Mais fácil que isso só História: Os segredos revelados de Assírios e Caldeus, Egípcios e Judeus, Gregos, Troianos, Persas e Romanos. Pareciam velhos amigos, de quem tudo se sabe. Quadros sinóticos para estabelecer e gravar a época áurea de cada um deles. Assim como algumas outras, Literatura também era fácil. A dificuldade aparecia nas Exatas: Geometria, um desastre; Matemática, uma tragédia. Física e Química, tabus proibidos, impenetráveis.



Um dia a festa acabou e um papel certificou que havíamos feito, e bem feito, a nossa lição. O diploma coroou o esforço, que não foi muito. O alicerce estava pronto. Era a hora, portanto, de completar a construção da vida.



Repassando as lembranças, me dou conta de que, na existência, prevaleceram, sim, as barras. Só que assimétricas!



Pétalas, quase pó, de um mal-me-quer, marcavam a página amarelada.



Mário (28/01/2010)

Semente


Estações






Semente.



Fruta madura.



Recomeço?



maria izabel

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Desencontro

Desencontro




Pois eu só caminhava sem destino

pelo prazer em si do movimento

que faz o gosto de qualquer menino

(eu era quase menino, nesse tempo)



Na mesma rua você vinha, e eu não sabia

mas vinha com pressa, a olhar as horas

e os astros nos deram, no meio do dia

um desses momentos que nada demoram



O acaso nos pôs, como às vezes faz

naquele mesmo instante, naquele mesmo ponto

tudo meticulosamente organizado, mas

você estava com pressa, e eu não estava pronto

                                        Sergio Castro Neves

Chá

Cha-no-yu




Tea in the Winter

Staring at you my mind figures

A spread butterfly





Cha-no-yu



Na tarde de inverno

Tomo chá e ao ver-te sonho

Borboleta aberta
                           Sergio C Neves

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Abstração

ABSTRAÇÃO




Nascer e morrer. Duas singularidades.



A primeira, nascer, não depende de nós; a segunda, morrer, também não depende de nós.



Nos cabe, tão somente, preencher, se não da forma mais prazerosa, a menos sofrida, o tempo que permeia essas duas singularidades.



Antes e depois delas o silêncio da eternidade.



                                              Mário (28/01/2010)

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Dois pra cá, dois pra lá



Desencontro




Passou pela porta de vaivém. Antes de olhar as pessoas, viu-se refletido na vasta parede espelhada. Desafinou das imagens no espelho. Rostos vermelhos ofegavam energia. A professora dizia com voz forte: atenção, pessoal! É 1-2, 1-2-3. A parte anterior do pé deve tocar o chão. Depois, com o calcanhar diminuiam o peso do corpo. Mais uma vez: 1-2, 1-2-3. Para trás. Agora, os dedos do pé tocando o assoalho! 1 e 2 e 3. Cha cha cha. O cavalheiro gira a dama, cha cha cha.



Sentiu-se estrangeiro naquele grupo de dança. Embaraçado, pensou em voltar atrás, mas reconheceu a voz feminina que berrou lá do fundo: Ádvena! Demorou a entender o sentido de palavra tão impenetrável. Era a namorada risonha que o apelidava fortuitamente. Sentiu o rosto se tingir de rubro. A lembrança da mãe dançando com o namorado o consumiu. Examinou Maria mais uma vez, a cintura cingida por vigorosas mãos. Não suportando aquela imagem, virou-lhe as costas e partiu.

                                                            Ave, Palavra

Dualidade



Dualidade




Em ti, terna dualidade...

O destino e a transcendência

A turbulência e a quietude

A demência e a sanidade

Traçam tragédias, tecem sentimentos

Tonalizam desculpas



Em ti, Deus e o Diabo

O Diabo e Deus

Donos do tempo

Desfrutam a desordem

Tecem domínios, desterram devaneios

Dormem, deliram e discursam...

Na tua terna dualidade diária.....



                    maria izabel

Poesia



Poeta da forma coloco nas peças um toque de sensibilidade.




Sutilezas da alma!



É meu jeito de fazer poesias...

                                            Maria Izabel


                         

Moringa

Por ora nem me lembro... da mão, do barro, da tinta, do trabalho e do fogo.




É bem verdade que me encanta a forma, a delicadeza, o tom azulado da peça.



Mas, agora... só sinto sede!

                                             Maria Izabel

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Teia


A teia



O ofício de Teresa foi sempre o mesmo. Tecer palavras e criar enredos estranhos, encostando aqui e ali o destino de protagonistas os mais desencontrados, vidas e sentimentos que se mesclavam em suas mãos pequenas, nos dedos ágeis teclando uma gasta “Lettera 22”, os olhos perscrutando futuros encontros e desencontros, mágoas, desapontamentos. Havia estórias de delicadas alegrias, de sorrisos abertos, de paixões tantas e tontos abraços, corpos caídos em campos de lavanda, grilos anoitecendo a noite, o amor siderado, a valsa colada nos olhos encantados de adolescentes, mulheres maduras de mãos dadas com homens vencidos pelo cansaço do existir. Era o ofício de Teresa dar vida e teclar nas laudas em branco os personagens que viviam com ela, como num sonho parindo destinos.



Sônia vivia os enredos da irmã e seguia a teia dos sentimentos quase cegos que a guiavam por noites e dias. Estancava em encruzilhadas perdidas ou tomava rumos incertos, ruas, alamedas, avenidas, vielas de periferia. Tinha um dia para viver o romance daquele dia – e tinha uma noite para viver todas as perdições daquela noite, e para tanto precisava de uma taça de vinho para inebriar-se na ponta do sonho daquele instante. Seu hálito de embriaguez era um convite à sedução de viver a vida a todo custo!



Eunice, a terceira irmã, trancava-se no seu mundo de sombras. Gostava de determinar o fim de tudo: das alegrias, dos amores, dos casamentos, das amizades, dos encontros. Decretava secamente a morte das pessoas sem qualquer remorso ou mágoa. Dava um sorriso mofo e empunhava a tesoura para cortar o próximo fio, o próximo destino que se findaria num átimo. Não se ligava nas criações de Teresa, nem se embriagava na vida fulgurante de Sônia. Era decididamente a pior das três moiras

                                                  Paulo Celso Pucciarelli

Pigmento


Paleta






Dia cinza!



Procura-se pigmento verde



pra mudança de estação.



maria izabel

Entrelinhas




                Como tonta sem ser barata. Como ângulo que se exibe e não se completa. Sem saber fim nem começo. Do avesso.


                                                              Teresa Melo

Painel


Uma possibilidade ou um nada. Curvas ou linhas. Um quadrado em outro e quem se importa? Melhor mirar o olho mágico da porta.

                                                                Teresa Melo



                  

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Texturas




...e assim como as linhas da vida que cruzam, descruzam, em retas e curvas paralelas e discordantes, a peça no centro da mesa se insinua.


Simples, ousada, intrigante.

                                   Arte pura
                                                          ( lilás)
                                                                    

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Desconstrução



Desconstrução




A menina abriu a porta do guarda-roupa. Precisava dispor todas as coisas de forma ordenada, organizar as idéias enoveladas pelo conflito familiar, ouvir o silêncio, a pulsação, o sangue correndo nas veias. O choro da mãe se distanciava. Criteriosa, media a distância entre os cabides, separava as roupas baseando-se nas cores: do branco ao preto. Gradativamente. Outro critério de arrumação se desdobrava dentro desse: o tipo de tecido, a idade da vestimenta, o destino de cada uma. A fúria do pai abrandava. Devagar, o batimento cardíaco amansou, o grito asfixiado no escuro das gavetas. Precisava abstrair o mundo ao redor e se dispersar pelos vãos. Evadia-se para outra realidade, ensaiando seus primeiros passos pelo alheamento. Concentrou-se na horizontalidade das listas, com intervalos breves e regulares. Era assim que idealizava a vida. Coerente e sem lapsos. Mas ouviu a mãe chorando baixinho. Nas listras sucessivas, o contínuo que se rompe. A vida? Um eterno desfazer para refazer.


                                                           Ave, Palavra